Há exatamente um ano, na invasão e depredação generalizada que promoveram nos edifícios-sede dos três poderes da República, em Brasília, extremistas de direita danificaram ou destruíram nada menos que 188 obras de arte e bens culturais de valor artístico, histórico e simbólico: 128 no Supremo Tribunal Federal, 29 na Câmara dos Deputados, 16 no Palácio do Planalto e 15 no Senado Federal – isso sem contar as peças roubadas e os mobiliários comuns destruídos.
Esse conjunto de 188 peças é formado por pinturas, tapeçarias, esculturas e móveis danificados em diferentes graus, que vão de avarias leves até a completa destruição, resultando em prejuízo que está sendo estimado não em milhões, como inicialmente se imaginou, mas em dezenas de milhões de reais. Alfredo Ceschiatti, Athos Bulcão, Bruno Giorgi, Di Cavalcanti, Joan Miró, Marta Minujín, Oscar Niemeyer, Roberto Burle Marx, Victor Brecheret são alguns dos artistas de renome, nacionais e internacionais, que tiveram obras suas vandalizadas nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
A Polícia Federal compôs uma série de laudos, em que foram valoradas cada uma das 188 obras vandalizadas pelos invasores e calculados os danos causados a cada uma delas. Como os processos relativos ao 8 de janeiro correm em segredo de justiça, os custos do dano de cada obra não podem ser divulgados. Um artigo científico sobre a metodologia, atualmente em estágio de revisão, será publicado e apresentado em congresso internacional nos próximos meses.
Restaurar uma obra não significa retorná-la ao seu estado anterior: se o custo de restauro corresponde meramente ao valor monetário que deveria ser empregado em uma eventual opção pela intervenção de restauração (decisão que ainda é atravessada por uma série de questões teórico-conceituais relativas à conveniência), o “valor do dano” diz respeito a uma importância pecuniária que seria representativa do amplo e complexo processo de eliminação, depreciação e alteração de aspectos culturais, históricos e artísticos por que passou a obra, se a consideramos em relação ao seu estado original, ao qual nunca mais será possível regressar.
A ideia, portanto, é que a matéria e as condições em que uma obra de arte foi criada são partes indissociáveis da história dessa obra e da obra em si mesma. Assim, mesmo que seja utilizado um material física e quimicamente idêntico no processo de restauro, e a obra seja retornada a um estado muito semelhante em imagem e estrutura ao seu estado anterior, a simples substituição da sua matéria inicial e a deturpação das suas condições originais de produção implicam perda significativa do seu valor original.